Enquanto
nos Estados Unidos os opioides são o problema, no Brasil a preocupação é com o
abuso de analgésicos comuns e anti-inflamatório.
O consumo excessivo de analgésicos simples, como paracetamol e dipirona, e anti-inflamatórios aumenta o risco de lesões estomacais, sangramentos, danos hepáticos e renais. |
O
risco no uso prolongado de analgésicos opioides, como a morfina, é maior do que
se imagina. De acordo com um estudo publicado na revista Proceedings of the
National Academy of Sciences (PNAS), o hábito pode provocar dor crônica. Ainda
mais grave, um estudo publicado recentemente no periódico científico JAMA
associou o uso contínuo de opioides a um significativo aumento no risco de
morte.
De acordo com Paulo Renato Fonseca, diretor científico da Sociedade
Brasileira para o Estudo da Dor (Sbed), enquanto nos Estados Unidos há uma
crescente preocupação com o abuso de opioides, no Brasil, o problema é o
consumo excessivo de analgésicos simples, como paracetamol e dipirona, e de
anti-inflamatórios, como nimesulida e cetoprofeno.
“Esse comportamento é um dos
principais desencadeantes da dor crônica, pois a causa da dor é no início
ignorada e/ou contornada com o uso dessas drogas. Mas, após tomar um remédio
específico por um tempo, seu efeito deixa naturalmente de ser percebido e a
pessoa tende a ingerir uma dose superior. Isso a deixa sob o risco de lesões
estomacais, sangramentos, danos hepáticos e renais”, diz o especialista.
Por
outro lado, no que diz respeito aos opioides, o Brasil está entre os 10 países
com as menores taxas de prescrição do mundo. “Aqui, a taxa de consumo é cerca
de 20 vezes inferior à de consenso, que é 192,9 mg ao ano por pessoa. Podemos
entender assim que a dor nos brasileiros é subtratada”, afirma Fonseca.
Segundo
o especialista, isso ocorre por dois motivos. O primeiro é a falha dos
profissionais ao mensurar e identificar a dor nos pacientes. Outro grande
impasse é a necessidade do receituário amarelo para este tipo de medicamento,
que reduz a quantidade de profissionais que podem prescrevê-lo. A principal
consequência disso é o sofrimento dos pacientes. Por outro lado, também há um
receio, por parte dos pacientes, em tomar este tipo de medicamento, mesmo
quando há prescrição médica.
Pesquisas indicam que, no Brasil, cerca de 60
milhões de pessoas convivem com o problema da dor sub ou não tratada. Nos
pacientes com câncer, estudos estimam que mais de 50% deles sofrem dor crônica
e, em mais de um terço deles, a dor é intensa, segundo informações da Sbed.
“Temos que encontrar o caminho do meio, o equilíbrio: usar os opioides em casos
indicados. Com o correto acompanhamento seu uso é sim adequado e recomendado”,
ressalta Fonseca.
Opioides - A Organização Mundial de Saúde (OMS) indica o uso
de analgésicos opioides como opção de tratamento para o controle da dor aguda e
crônica de intensidade moderada e forte, de acordo com as escalas de mensuração
estabelecidas globalmente. Este tipo de medicamento também é um dos componentes
da anestesia geral.
A preocupação com o uso de opioides se agravou após o
aumento do número de mortes associadas à overdose destes medicamentos,
principalmente nos Estados Unidos. Tanto que, recentemente, o Centro de
Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês)
lançou, pela primeira vez, diretrizes sobre o uso e prescrição de analgésicos
desta classe terapêutica como oxicodona, metadona, morfina e derivados da
codeína.
Por Giulia Vidale
fonte: veja.abril.com.br/saude